* Revista Veja
Com a profissão em alta, estes alunos de engenharia da FEI em São Bernardo do Campo, turma que se forma neste ano, receberam convites de emprego ainda durante o curso
NA ECONOMIA MODERNA, AS CARREIRAS MAIS PROMISSORAS SÃO PARA OS PROFISSIONAIS COM CONHECIMENTO ESPECÍFICO DE UMA DETERMINADA ÁREA E CAPACIDADE DE CONCILIAR HABILIDADES TÉCNICAS COM MUITA CRIATIVIDADE
GABRIELA CARELLI
Como escolher as carreiras mais promissoras dos próximos vinte anos? Uma resposta pode ser encontrada no mais abrangente estudo já realizado sobre o assunto. The Sizape of Jobs to Come (Como serão os empregos, em tradução livre), concluído no ano passado pela consultoria inglesa FastFuture. com o patrocínio do governo britânico.
A pesquisa apontou 110 carreiras cujo pomo em comum é o fato de serem fundamentadas e terem surgido na esteira da inovação e dos avanços científicos. A maior parte delas se concentra em áreas como internet, meio ambiente, demografia e tecnologia. O estudo considera que, devido as características próprias, essas carreiras representam uma ruptura na tradição do trabalho, um verdadeiro "novo emprego". Para ocupá-lo. é preciso ser especialista, ter conhecimento específico e profundo de uma determinada área. Coisa que não significa. necessariamente, exibir um diploma ou um curso de pós-graduação, ainda que a formação universitária seja o mínimo necessário na maioria das atividades.
20 carreiras em alta
OS AVANÇOS TECNOLÓGICOS, AS MUDANÇAS DEMOGRÁFICAS, A MODERNIZAÇÃO E A EXPANSÃO DA ECONOMIA BRASILEIRA ESTÃO CRIANDO UMA NOVA GAMA DE ATIVIDADES PROFISSIONAIS. NESTAS PÁGINAS, VEJA APRESENTA VINTE DESSAS CARREIRAS PARA QUEM NÃO QUER MAIS DO MESMO. ELAS FORAM SELECIONADAS COM A AJUDA DE CONSULTORIAS ESPECIALIZADAS E OFERECEM FARTURA DE VAGAS E BOA REMUNERAÇÃO
A especialização pode muito bem ser decorrente da experiência, do talento e da capacidade de cada um para encontrar soluções originais em um mundo cada vez mais embaralhado. Escolhido neste ano uma das 100 pessoas mais influentes do mundo pela revista Time, o finlandês Peter Vesterbacka é uma estrela em ascensão desse "novo emprego" . Ele largou um cargo na Hewlett-Packard, o gigante dos computadores, para tentar ganhar a vida com seu hobby, o desenvolvimento de games. Com 200 milhões de downloads em smartphones e tablets em pouco mais de um ano, seu jogo Angry Birds o transformou numa celebridade digital. E também em um homem rico.
O novo emprego é um híbrido dos extremos profissionais do século passado. Os títulos atuais tendem a ser referência a atividades tipicamente intelectuais (técnico, especialista, analista), mas quase sempre envolvem executar tarefas com as próprias mãos, como os operários numa fábrica. Um desenhista de animação em 3D, para citar como exemplo uma nova atividade na qual os brasileiros se destacam, realiza um trabalho basicamente cerebral, criativo, mas necessita de habilidade manual e conhecimento técnico para se utilizar do computador e de programas gráficos de última geração. A expansão em ritmo acelerado e, sobretudo, a modernização da economia brasileira abriram espaço no país para as "novas profissões" Abrir espaço, por sinal, é uma imagem pobre para descrever as imensas dimensões do fenômeno. O Brasil criou 2,8 milhões de empregos formais no ano passado, quase o dobro do recorde anterior, de 2007. Prevê-se que fechará este ano com o acréscimo de outro 1,9 milhão de vagas. Desse total, 1,2 milhão não será preenchido por absoluta escassez de candidatos com a qualificação necessária.
Duas pesquisas recentes - uma da Confederação Nacional da Indústria, com 1616 empresas, e outra da Fundação Dom Cabral, com as 130 maiores companhias do país revelaram que a dificuldade em contratar é um problema sério em sete de cada dez empresas brasileiras. Isso decorre, em parte, da deficiência da educação nacional, uma ferida que só o tempo e boas políticas podem sanar. O maior abismo, contudo, é consequência direta do enorme apetite das empresas brasileiras por especialistas nas "novas profissões". VEJA escolheu vinte dessas profissões para ser analisadas de perto. Parte delas consta da relação elaborada pelo estudo inglês, e o critério adotado na seleção final foi objetivo: a existência de demanda no Brasil para cada uma dessas profissões.
Eles aproveitaram a oportunidade
Uma economia que se encontra em expansão, como a brasileira, oferece inúmeras chances para quem quer crescer e se prepara para isso. Os personagens que aparecem nesta e nas próximas páginas souberam aproveitar esse momento de modernização do Brasil. Eles fizeram acontecer em suas vidas.
Flávio foi atrás do petróleo
O que precisou fazer: Mudar de área - Cursos de especialização - Aprender um novo idioma
O carioca Flávio Vaz formou-se em administração de empresas e por três anos trabalhou em duas empresas de telefonia celular. Constatou que a área de petróleo e gás oferecia muitas oportunidades de crescimento e melhor remuneração. Candidatou-se a uma vaga numa multinacional americana fabricante de equipamentos de exploração submarina de petróleo e assumiu a função de coordenador de projetos. Esse cargo, até há alguns anos, era ocupado na empresa apenas por engenheiros, mas, por falta de mão de obra especializada, passou a ser entregue a outros profissionais. A empresa bancou cursos técnicos de engenharia mecânica para Flávio. Ele passou a ganhar 60% a mais do que quando trabalhava com telefonia. Hoje, depois de fazer um curso de espanhol na Argentina, trabalha para outra empresa na área de petróleo, uma multinacional norueguesa.
Leonardo apostou no futuro da genética
O que precisou fazer:
Optar por uma especialidade pouco convencional Cursos de especialização
Na adolescência, o paulista Leonardo Varuzza, de 32 anos, divertia-se desenvolvendo programas para o sistema operacional Linux e era fascinado por ficção científica. Na hora do vestibular, optou pelo curso de física e uma disciplina pouco convencional da grade curricular despertou seu interesse: a bioinformática. Leonardo resolveu, então, fazer pós-graduação na área. Hoje, ele é um dos poucos bioinformatas brasileiros. Sua função é ler e interpretar os resultados de maquinas de sequenciamento genético. Ele também trabalha no aprimoramento dos equipamentos e treina profissionais de hospitais e clínicas para lidar com eles. Quando terminei o doutorado, o sequenciamento genético estava apenas começando. Não fazia ideia de que a profissão se tornara tão relevante", ele conta. "Foi uma escolha certeira. Sou viciado em buscar soluções, a essência da minha profissão". completa.
Thales transformou um hobby em profissão
O que precisou fazer:
Trocar de faculdade
Mudar de cidade
Especializar-se em aplicativos
O fluminense Thales Schmalz, de 30 anos, sempre foi apaixonado por games. Ainda na faculdade de engenharia, descobriu uma nova graduação que poderia abrir-lhe as portas para realizar o sonho de desenvolver jogos eletrônicos. Largou a engenharia para cursar sistemas de informação. Já formado, e sem conseguir emprego, deixou Resende, no Rio de Janeiro, rumo a São Paulo, para trabalhar numa firma de desenvolvimento de softwares. Depois de cinco anos, foi convidado para ocupar uma vaga em uma empresa de produção de aplicativos para dispositivos móveis. Hoje,Thales é gestor de projetos para iPhone e iPad. Nas horas vagas, cria seus próprios apps e os põe a venda na loja da Apple iniciativa que, segundo ele, por enquanto é mais uma diversão do que fonte de renda. "Desenvolver aplicativos por conta própria ainda é uma loteria. Criei quatro produtos, que me renderam 280 reais. Mas, quando uma empresa nos contrata, paga muito bem", ele garante.
Lígia largou o consultório
O que precisou fazer:
Uma nova faculdade
Cursos de especialização
Há cinco anos, a paulistana Lígia Ribeiro formou-se em fonoaudiologia e passou a dividir o tempo entre o próprio consultório e o atendimento numa empresa. Em pouco tempo, concluiu que não iria muito longe. Na empresa, não havia possibilidade de crescimento. No consultório, o retomo financeiro era baixo ela praticamente pagava para atender os pacientes. Lígia decidiu mudar de profissão. Pesquisou as áreas mais promissoras e se matriculou num curso superior de tecnologia da informação. Apenas três meses após o início das aulas, já trabalhava como estagiária. Fez vários cursos complementares de especialização e, após a conclusão da nova faculdade, choveram propostas de emprego. Ela passou a ganhar quatro vezes o que recebia nos tempos de fonoaudióloga. "Na minha turma de faculdade, metade dos colegas abandonou o consultório", ela conta.
Um elo com o mercado
UM NOVO FUNDO CRIADO NA ESCOLA DE ENGENHARIA DA USP PARA CAPTAR DINHEIRO DA INICIATIVA PRIVADA PODE SER UM PASSO DECISIVO PARA LIBERTAR A ACADEMIA DE AMARRAS BUROCRÁTICAS E, ENFIM, APROXIMÁ-LA DO MUNDO REAL
A criação de um fundo para canalizar doações do setor privado, livre das ingerências do estado e sob a gestão de um conselho formado por empresários, causa espanto pelo cenário do qual ele emerge: uma universidade pública brasileira.Trata-se de algo pioneiro no Brasil Lançada na semana passada, a iniciativa é da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo, que desde sua fundação, em 1893, forma os melhores engenheiros do país.
O propósito é ter não apenas mais dinheiro como liberdade para gastá-lo com o fundamental: pesquisa e laboratórios de alto nível. Isso ecoa uma prática que vem sendo decisiva para alçar instituições como Harvard ou Yale, nos Estados Unidos, ao topo do ranking mundial do ensino superior. Em tais universidades (que, ao contrário da USP, não são públicas), quase a metade do orçamento é composta de doações na casa de bilhões de dólares. O fundo da Poli começa com meta bem mais modesta. O objetivo é somar ao caixa 25 milhões de reais por ano o equivalente a um quarto da verba já garantida pelo estado (da qual 80% se destinam ao pagamento de salários). Em troca, as empresas receberão 30% de isenção fiscal sobre o valor doado, modelo que segue o de universidades estrangeiras. Resume o doutor em engenharia José Roberto Cardoso, diretor da Poli: "Para dar aos alunos um diploma de valor equivalente ao das melhores instituições do mundo, não é mais possível às universidades brasileiras depender do estado para tudo".
Outros centros situados em universidades públicas brasileiras já haviam encontrado caminhos jurídicos para angariar recursos privados de forma permanente. Muitos criaram fundações universitárias, que começaram a proliferar na década de 70 por todo o ensino superior público e foram cruciais para consolidar núcleos de alto padrão, como a Coppe, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nenhuma dessas iniciativas, no entanto, foi tão radical quanto a da escola de engenharia da USP talvez o primeiro passo para uma mudança de maior espectro no sistema universitário público. Enquanto nas fundações ainda é preciso submeter os grandes gastos e decisões a uma alçada federal, a Poli criou um fundo autônomo, cujo dinheiro poderá ser gasto como julgar melhor, apreciação que ficará a cargo de um conselho constituído pela própria faculdade. O papel do estado será tão somente garantir os incentivos fiscais aos doadores, algo que a Poli conseguiu enquadrando-se na legislação que faz de seu fundo uma Organização da Sociedade Civil de interesse Público (Oscip). Não existe no Brasil uma lei de endowment (como é conhecida em países ricos) prevendo doações do setor privado - um flagrante atraso que resulta em situações absurdas na academia. Sem nenhum incentivo, empresários brasileiros acabam dando dinheiro a instituições estrangeiras.
Há um aspecto menos visível na iniciativa da Poli que é decisivo para que a faculdade avance: sua aproximação com o setor privado. No conselho que fará a gestão do fundo, além de professores e ex-alunos, estarão empresários que ajudarão a sinalizar para a academia as verdadeiras demandas do mercado. Essa conexão, que já se demonstrou tão eficaz na produção de conhecimento e inovação em países mais desenvolvidos, no Brasil costuma ser vista como afronta à autonomia universitária uma bobagem ideológica que só mantém as instituições brasileiras longe do topo. A própria USP foi palco de um episódio recente que ilustra o tom predominante. A Faculdade de Direito havia conseguido doações de um banco e de um escritório de advocacia para reformar algumas salas. Em troca, faria um pequeno gesto: pendurar na parede placas com o nome dos doadores. Pois professores e alunos se insurgiram quando tais placas ficaram prontas, fazendo até greve e acusando diretores da faculdade de querer "privatizar o ensino" infelizmente, ainda impera nas universidades públicas brasileiras uma mentalidade tacanha, distante da academia moderna', diz o ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza.
O fundo recém-criado pela escola de engenharia da USP também tem o efeito de livrá-la, em certo grau, da pesada burocracia que recai sobre as universidades públicas no Brasil. Para se ter uma ideia dos entraves, uma fabricante de computadores tentou doar centenas de máquinas à Poli, mas a faculdade, que precisava delas, viu-se obrigada a recusar. Isso porque, como ocorre com as demais universidades, qualquer nova aquisição até mesmo fruto de doações precisa ser submetida à lei de licitações. Nesse caso, a Pali deveria procurar outras empresas do mercado para saber se elas também teriam interesse em lhe doar computadores e, só então, poderia escolher a melhor opção. Diante de tantos obstáculos, a Poli desistiu. O mesmo principio causa morosidade a processos básicos, como a compra de aparelhos e materiais que se prestam à pesquisa uma barreira à própria investigação cientifica. Historicamente, as universidades públicas brasileiras se queixam de escassez de verbas, mas, antes de tudo, está claro que é preciso gerir melhor o que já têm e despregar-se do estado para conseguir figurar entre as melhores. O novo fundo de doações da Poli é uma boa notícia nesse sentido."Ao fim e ao cabo, a tendência é que o próprio ensino melhore, algo crucial para que nossos jovens tenham chance de encarar a competição global", conclui o matemático Jacob Palis, presidente da Academia Brasileira de Ciências.
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